segunda-feira, 12 de março de 2012

Experiências durante o Nehan Sesshin no Zendo Brasil - São Paulo - 17/02 a 22/02


O Nehan Sesshin é um retiro tradicional realizado em celebração a passagem do Buda histórico, Xaquiamuni Buda, ao Parinirvana/Nirvana Final, o que teria ocorrido em 15 de fevereiro de 543 a.C, aos seus 80 anos.



Aqui minhas impressões:

Antes de chegar:
Conheci a Monja Coen pela internet. Li seus textos e vi palestras e entrevistas pelo youtube. Ouvindo-a, sentia como se identificasse nas suas palavras uma verdade que eu mesmo tentava expressar, mas que não tinha suficientemente articulada ou mesmo compreendida. Quis conhecê-la e trilhar o caminho que ela dizia ser suficiente para trazer paz aos espíritos inquietos: o zazen (meditação sentada).

1º dia.
A técnica do zazen:
O Sesshin começou com instruções informais aos iniciantes sobre como fazer zazen: sentados num safu (parece-se com uma almofada), com a coluna ereta, queixo levemente em direção ao peito e olhos semi-abertos em 45° para baixo fitando uma parede branca. Com as pernas cruzadas e os joelhos apoiados no chão para manter a posição com menos esforço. Os dedos da mão esquerda ficam sobre os dedos da mão direita, com os dois polegares se tocando muito levemente (o que forma uma elipse). Nessa posição, as mãos ficam apoiadas rente ao tronco logo abaixo do umbigo. 
E lá fui eu em busca da paz interior no primeiro zazen da noite.

Minha primeira experiência de meditação em grupo:
Sentei, imóvel, junto com outras 35(?) pessoas por 30 minutos. Tentei observar minha mente e não mexi para trocar as pernas de posição quando a esquerda ficou dormente (como costumo fazer na meditação que pratico em casa). 
Um período de zazen é sempre seguido de um outro de meditação andando (kinhin), que dura 10 minutos. Anda-se MUITO devagar mantendo os olhos para baixo. O propósito é concentrar-se em cada mínimo movimento do corpo, mas é também um momento para aliviar as dores. Eu, entretanto, não consegui levantar durante a maior parte desses 10 minutos, tamanha a dormencia em que estava minha perna esquerda.
O sino toca por três vezes e voltamos a sentar para outro período de 30 minutos de zazen. Depois de 5 min minha perna já estava doendo novamente, e lembrei que a sensei/Monja Coen, numa entrevista, falou de uma aluna que sempre se movimentava quando o corpo começava a doer, até o dia que ela decidiu não mais se movimentar, voltou a atenção para a própria mente e a dor desapareceu. Achei a história o máximo e resolvi fazer igual. Não movimentei a perna pelos 20 min seguintes, por mais que a dor fosse intensa, esperando que ela desaparecesse, até que fui praticamente tomado por um desmaio. Três monges me abanavam (apenas os que estavam ao meu lado, pois os demais continuavam a olhar para a parede). Me ofereceram um copo d'água, e sal para a pressão. 
Fiquei envergonhado pelo o que aconteceu, mas como o evento começou as 20h, não haveria outros períodos de zazen naquele dia.

2º dia.
O relógio atrasado:
Pela manhã eu e o monge Ryozan preparamos uma papa de arroz, cozinhamos legumes, fizemos uma grande salada de frutas e fomos a feira. Depois, por acaso, olhei para o relógio. Marcava 9h30. Por um momento pensei que o relógio estava atrasado, afinal os legumes do almoço estavam deliciosos.Foi quando lembrei que aquele havia sido apenas o café da manhã, pois havíamos acordado as 5h, quando ainda havia estrelas no céu.
Nos dias seguintes o regime de 6h30 de sono diário seria uma das grandes dificuldades que enfrentei.

Conversa com Monja Coen:
Ainda pela manhã (elas eram muito longas) a mítica (para mim) Monja Coen trocou umas palavras comigo: "Você tem certeza de que não é melhor você ir embora? Perceba a forma que você está sentado. Estás nitidamente desanimado. Acho que esse lugar não é o que você tinha imaginando quando você olhou os vídeos no youtube. Talvez esse não seja um lugar para você."
De fato, naquela manhã eu estava meio para baixo, ainda por conta do quase-desmaio do dia anterior. Mas achei ela apriorista pois, para mim, estar desanimado e desistir são coisas muito distantes.
Mais tarde, naquele mesmo dia, ela disse que até o final do sesshin ela conseguiria me fazer ter raiva dela, em meio a risos. De fato, não me pareceu alguém que transborda amor, como tinha pensado ser pelos vídeos do youtube.

Conversa com o monge Ryosan:
Ryosan é alguém com quem simpatizei desde o primeiro dia, quando ele me abanava. Ele ouviu a Monja Coen/sensei insinuar que eu deveria desistir e me disse que ser rígida é parte das suas atribuições. Que ela está ali para procurar e explorar nossas fraquezas, para que possamos trabalha-las. Lhe respondi que eu só iria embora se ela me expulsasse abertamente.

3º dia.
O que é zazen?
A meditação não se dá apenas quando estamos sentados num zafu com a coluna ereta, mas é um estado da mente. A posição do corpo é apenas um facilitador. E enquanto descascava e cortava frutas para um outro café da manhã, tentava manter uma mente meditativa, isto é, estar inteiro naquela atividade. Foi quando percebi que é necessário energia, muita energia para meditar. Que estar em plena atenção cortando frutas não significa cortá-las muito devagar ou muito rápido. Que se pode cortar as frutas com energia ou preguiçosamente. E que se pode sentar imóvel num zafu, manter a coluna ereta e, sem energia, não fazer zazen. Da mesmo forma pode-se sentar IMÓVEL CHEIO DE ENERGIA(!), empregar a plena atenção e fazer zazen.
Assim, zazen é uma técnica de meditação de atenção (a outra categoria de meditação é a de concentração). Nela, não há inicialmente um obejeto de meditação diferente da  própria mente. Deve-se observá-la com distanciamento, percebendo os pensamento e os não-pensamentos que surgem entre eles. Deve-se observar o corpo, a respiração, a dor. É uma viagem para dentro de si mesmo e deve-se ter energia pois a mente é sedutora e, se a vontade for fraca, é fácil embarcar numa viagem que nos afasta do que acontece no AGORA. (Nesse mesmo dia, a noite, a Monja Coen/sensei falou em uma palestra sobre esse assunto, utilizando curiosamente o exemplo de cortar as frutas.)



Servindo o almoço:
Comer de acordo com a tradição budista é difícil, e desconfio fortemente que seja proposital, para dificultar que se automatizem os movimentos, forçando a atenção a estar sempre no que está sendo feito. Monja Coen/sensei conseguia arrumar as suas tijelinhas e ainda corrigir (com energia) quem não dobrava o lenço de acordo com a tradição.
Servir as refeições é um pouco mais fácil, com exceção da sopa. Quando fui servir a primeira pessoa, a sensei estava de olho e me "chamou a atenção" para 2 erros que eu estava cometendo. Tentando corrigir e fiz ainda pior. "São com três dedos!! Tira esses outro dois!!!". Ai eu tirei os dois dedos da mão errada. "Como é que colocam alguém que não sabe nada para fazer isso?!!!". Então eu fiz mais umas duas coisas erradas e ela começou a rir. Fiquei desconfiando que a rabugisse era só de fachada.

Banquinho de zazen.
A vara zem:
Resolvi minha dormência nas pernas sentando num banquinho, o que é muito mais confortável. Ainda assim, não é fácil manter a coluna ereta e o corpo imóvel por vários períodos diários de 30 min. 
No terceiro dia, sentado no banquinho, ouço um ou dois estalos vindos de dentro da sala de zazen. Como um bom aluno, continuei olhando para a parede branca. A seguir ouvi mais uns dois estalos e com  o "canto de olho" vi uma movimentação. Não resisti: olhei. Vi uma monja segurando régua de madeira com aproximadamente 1 metro de comprimento e 10cm de largura. A seguir ela levantou a régua e bateu forte no ombro de um dos meus colegas. Fez um barulho alto e me voltei rapidamente para a parede, torcendo para que ela não tivesse visto meu mal comportamento/ter olhado. 
Fiquei definitivamente assustado com o barulho que aquela régua fez. Definitivamente. Para piorar, ela começou a vir para o canto da sala em que eu estava, e o que era para ser uma meditação passou a ser uma briga com o corpo para deixar a coluna o mais reta possível, mantendo-me praticamente sem respirar, para não ser punido. Foi quando a monja, andando m-u-i-t-o devagar, chegou até onde eu estava e parou atrás de mim. Condescendente, fechei os olhos... quando veio o barulho! Levei um tremendo susto, mas quem havia sido corrigido foi a pessoa que estava atrás de mim. Ufa!
Apesar de não poder, oficialmente, conversar durante o sesshin, na primeira oportunidade perguntei sobre a tal régua. Me contaram que ela se chama kyosaku, e a monja só bate nas pessoas que pedem ou que a monja vê que estão meio dormindo, mas que ela sempre avisa antes. (Quer dizer, não tem nada a ver com estar sentado torto.)
Num outro dia, na meditação pela manhã, pedi duas vezes pelo kyosaku. Confesso que fez bem para minha meditação, mas eles deveriam ter avisado, desde o primeiro dia, o que era o kyosaku.

5º dia.
O cansaço bate à porta:
Por estar dormindo horas a menos do que estou acostumado, o cansaço físico e mental estava atingindo marcas inéditas. (É ridículo, mas eu estava considerando tirar uma soneca sentado no banheiro.) Juntando-se a isso estavam as várias horas de meditação diárias, o que não é relaxante. Abaixo um depoimento de Charlotte Joko Beck sobre um sesshin:
"Para ser honesta, o retiro é um sofrimento controlado. Temos a oportunidade de encarar nosso sofrimento numa situação prática. Quando nos sentamos para praticar, todos os atributos tradicionais de uma boa aluna zen são postos em xeque: resistência, humildade, paciência, compaixão. Essas coisas parecem fantásticas nos livros, mas não são tão atraentes quando estamos com dor. É por isso que o sesshin deve não ser fácil: temos de aprender a estar com o nosso sofrimento e ainda assim agir da maneira apropriada. Quando aprendemos a estar com nossas vivências, sejam elas quais forem, temos mais consciência do contentamento que é a nossa vida".
Honestamente, eu não estava fisicamente ou mentalmente preparado para para a rotina que o  sesshin impõe. Por isso, após o almoço, sai um pouco do Zendo para caminhar e pensar sobre o que eu estava vivendo. Passei no mercado, comprei pães de queijo (meu vício) e encontrei a monja Heishin.

Conversa com a monja Heishin:
Até este momento o que mais me chamou a atenção foi a alegria serena em que sempre pareciam estar a monja Heishin e a monja Waho-san, e eu não identificar esse mesmo padrão na Monja Coen/sensei. 
Fiquei feliz por ter encontrado a monja Heishin no mercado. Ela me explicou que Dharma é a realidade e o significado de uma "oração" que fazemos durante o zazen:
"O Dharma, incomparavelmente profundo e precioso, é raramente encontrado mesmo em centenas de milhares de anos. A mim, agora, é facultado vê-lo, ouvi-lo e compreendê-lo."
Mas dessa conversa o que mais mexeu com os meus conceitos foi ela ter dito que apesar do caminho para a iluminação ser trilhado a partir do desapego, você não estará nele se não houver o desapego ao desapego. Acho que ela quis dizer que o fluxo das escolhas que fazemos deve ser contínuo e natural.
Voltei para o Zendo, fiz alguns asanas (posturas de yoga) e pranayamas (exercícios respiratórios) para estimular a mente e voltei a sentar em zazen.

6º dia.
Corrida matinal:
Após o último período de zazen do sesshin, Monja Coen seguiu para uma caminhada/corrida em frente ao estádio do Pacaembu sob os olhares atentos da "runner girl" Mônica Peralta, que encontrou mais quatro alunos da sensei dispostos ao exercício, eu incluso.
Fora do Zendo, correndo enquanto o Sol nascia, encontrei na Monja Coen uma pessoa muito divertida. Não houve "puxões de orelha" ou broncas ou aspereza e, com simplicidade e bom humor, nos divertíamos. Foi quando vi a senhora simpática de 64 anos que vestia roupas de ginástica, sorria para a vida e com e vida, e a reverenciei pela humanidade que vi nela, não pela posição que ela ocupa. Ali, sem qualquer apetrecho que lembrasse sua autoridade, foi quando a admirei.

Dokusan:
Dokusan é uma conversa privada com a mestre zen, a qual é normal ocorrer durante sesshins. Conversa-se sobre a condução da prática zen e das experiências tidas durante as meditações. No meu caso ela só ocorreu depois que o sesshin havia terminado e conversamos sobre yoga, kundalini e prana. Mas mais intenso do que termos conversado, foi quando nos silenciamos e ela procurou o meu olhar. Olhamos nos olhos um do outro por vários segundos e senti como se ela estivesse observando a minha alma e de que eu estava nú. Púdico, sorri e desviei os olhos. Ela sorriu de volta, me parabenizou por eu ter "aguentado" todas as suas broncas. Reverencie-a em profundo respeito, pois encontrei em seu olhar uma fração do que acredito que chamam de Buda.

Uma percepção:
Apesar de vivermos em uma sociedade que cultiva a liberdade, estamos cada vez mais presos ao passado e ao futuro. Não percebemos que o passado já foi e que o futuro não existe.
Enquanto não abrirmos mão desses conceitos e não estivermos plenos no agora, não seremos livre.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Multicellular Life Evolves in Laboratory


Wired Science (January 17, 2012)
By Brandon Keim - An evolutionary transition that took several billion years to occur in nature has happened in a laboratory, and it needed just 60 days.
Under artificial pressure to become larger, single-celled yeast became multicellular creatures. That crucial step is responsible for life’s progression beyond algae and bacteria, and while the latest work doesn’t duplicate prehistoric transitions, it could help reveal the principles guiding them.
“This is actually simple. It doesn’t need mystical complexity or a lot of the things that people have hypothesized — special genes, a huge genome, very unnatural conditions,” said evolutionary biologist Michael Travisano of the University of Minnesota, co-author of a study Jan. 17 in the Proceedings of the National Academy of Sciences.
In the new study, researchers led by Travisano and William Ratcliff grew brewer’s yeast, a common single-celled organism, in flasks of nutrient-rich broth.
Once per day they shook the flasks, removed yeast that most rapidly settled to the bottom, and used it to start new cultures. Free-floating yeast were left behind, while yeast that gathered in heavy, fast-falling clumps survived to reproduce.
Within just a few weeks, individual yeast cells still retained their singular identities, but clumped together easily. At the end of two months, the clumps were a permanent arrangement. Each strain had evolved to be truly multicellular, displaying all the tendencies associated with “higher” forms of life: a division of labor between specialized cells, juvenile and adult life stages, and multicellular offspring.
“Multicellularity is the ultimate in cooperation,” said Travisano, who wants to understand how cooperation emerges in selfishly competing organisms. “Multiple cells make make up an individual that cooperates for the benefit of the whole. Sometimes cells give up their ability to reproduce for the benefit of close kin.”
Since the late 1990s, experimental evolution studies have attempted to induce multicellularity in laboratory settings. While some fascinating entities have evolved — Richard Lenski’s kaleidoscopically adapting E. coli , Paul Rainey’s visible-to-the-naked-eye bacterial biofilms  — true multicellularity remained elusive.
According to Travisano, too much emphasis was placed on identifying some genetic essence of complexity. The new study suggests that environmental conditions are paramount: Give single-celled organisms reason to go multicellular, and they will.
Apart from insights into complexity’s origins, the findings could have implications for researchers in other fields. While multicellularity would have a hard time emerging now in nature, where existing animals have a competitive advantage, the underlying lesson of rapid, radical evolution is universal.
“That idea of easy transformability changes your perspective,” said Travisano. “I’m certain that rapid evolution occurs. We just don’t know to look for it.”
Targeted breeding of single-celled organisms into complex, multicellular forms could also become a biotechnological production technique.
“If you want to have some organism that makes ethanol or a novel compound, then — apart from using genetic engineering — you could do selection experiments” to shape their evolution, Travisano said. “What we’re doing right here, engineering via artificial selection, is something we’ve done for centuries with animals and agriculture.”


Citation: “Experimental evolution of multicellularity.” By William C. Ratcliff, R. Ford Denison, Mark Borrello, and Michael Travisano. Proceedings of the National Academy of Sciences, Jan. 17, 2012.