terça-feira, 17 de maio de 2011

Acompanhamento da posição de maratonista

(Originalmente escrito para o blog Física dos Esportes)


A Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro, lançou edital no início de 2010 buscando apoiar o desenvolvimento de inovações no esporte, e já vem colhendo seus frutos.
Um dos projetos apoiados pela FAPERJ foi o do empresário Bruno Leonardo de Souza Christ, que propôs utilizar a tecnologia de identificação por rádio-frequência - RFID, na sigla em inglês - para o controle e acompanhamento de esportistas cíclicos, como maratonistas e ciclistas. São esportes que podem ter grande número de participantes (visto os 20.000 atletas da última São Silvestre), com muitos deles alcançand­o as linhas de chegada quase que simultaneamente (como ocasionalmente ocorre nas arrancadas finais de grandes provas de ciclismo), o que cria problemas para ranqueá-los e torna praticamente impossível acompanhar o desempenho de cada um dos atletas em diversos pontos ao longo da prova... ao menos até agora.
A tecnologia criada por Bruno em parceria com a Allen Informática e financiamento da FAPERJ, promete acabar com esses problemas. O atleta utilizaria no tronco, ou pulso ou até na própria bicicleta, um RFID descartável e de baixo custo, fazendo assim o seu monitoramento inclusive em multidão de outros esportistas.
O RFID utilizado por Bruno consiste num transponder, do tamanho de uma etiqueta, que emite um sinal em resposta a uma emissão de uma base transmissora. Esses aparelhos comunicam-se entre si através de rádio-frequência, que faz parte do espectro eletromagnético, da mesma forma que a luz visível, o raio-X e o microondas. Todas elas viajam a velocidade da luz e diferenciam-se entre si apenas pelo seu comprimento de onda, como se diferenciam cada uma das cores que nosso olho consegue distinguir. Essa é uma definição mais ampla sobre o que é a luz, e que costumamos nos referir apenas como aquilo que conseguimos enxergar, que, na realidade é a sua menor parte.
Assim, a rádio-frequência também é luz, e viaja a 300.000 Km/s (com essa velocidade se daria sete voltas e meia em torno na Terra em apenas um segundo). Essa é outra vantagem do método de medição utilizado por Bruno, pois possui atraso de medida apenas referente ao tempo de resposta do equipamento, o que é desprezível. Tecnologia similar já é utilizada, por exemplo, em painéis de carros para o pedágio automático, ou em equipamento anti-furto, pois cada RFID é capaz de ter um único número de identificação.
A proposta de Bruno é colocar série de bases transmissoras ao longo da prova e colher, para cada atleta, os tempos e distâncias percorridas, permitindo fazer uma análise rigorosa de seu desempenho. Já foram realizados testes em competições, sendo o resultado satisfatório tanto a Bruno como para os atletas e organizadores do evento. O objetivo agora será convencer outros organizadores a testar a idéia e, quem sabe, até chegar nas Olimpíadas de 2014!
Pessoalmente, acredito nessa ideia.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Física e arte: análise do quadro "Naturaleza Muerta Resucitando", de Remédios Varo

A população da Europa no sec. XVII se habituava a existência da prensa móvel, criada por Johannes Gutenberg em 1439, que retirou na igreja a monopólio sobre os livros, e via crescente sua curiosidade acerca da ciência, dos astros, da alquimia e da matemática, afinal, a pouco a Terra havia sido deslocada do centro do universo, para apenas um local qualquer no infinito do cosmo.
Foi um século de efervescência, com cafés abrigando “faculdades à centavos” entre intelectuais burgueses e homens nascidos do povo, para conjecturar a respeito da filosofia da vida e da natureza. De um desses encontros surgiu importante oposta entre dois cavalheiros, a ver quem descobriria primeiro os motivos que impulsionam os planetas a volta do Sol. Um deles, ciente da dificuldade do problema proposto, foi a procura do professor de matemática da Universidade de Cambridge: Isaac Newton, que, surpreendentemente, já tinha a resposta.

Quadro Naturaleza Muerta Resucitando, de Remédios Varo

O quadro da pintora surrealista Remédios Varo, Naturaleza Muerta Resucitando (1963), sintetiza muito da essência dessa época e de um conhecimento que foi aos poucos sendo dilapidado por Galileu Galilei, Johannes Kepler e Isaac Newton, tomando como metáfora a maçã que o jovem Newton teria visto cair de um pomar e que o fizera questionar sobre as forças que regem a gravidade.
Há controvérsias sobre a veracidade da história da maçã, que Newton apenas começou a contar após atingir idade mais avançada, mas é certo que suas ideias lançaram luz a toda ciência da época, e nova lenha aos acalorados debates científicos, o que Varo “brilhantemente” representa por uma vela no centro de uma mesa, à volta da qual giram maçãs e peras, numa coreografia com certa confusão.
A física newtoniana, pela primeira vez, escrevia equações que eram aplicáveis a fenômenos triviais, como o lançamento de projeteis, e a grandes eventos, como a órbita de planetas, criando um elo entre a física da Terra e física universal. Assim, nosso planeta nem possuía um local especial na “criação”, nem era provida de leis físicas diferenciadas.
No quadro de Varo também podemos ver uma representação da formação de um sistema solar, podendo ser o nosso ou não, visto que são as mesmas leis que regem todo o universo. No centro do sistema teríamos uma protoestrela, e à volta, protoplanetas, que continuam a crescer a partir da sua aglomeração violenta com outros protoplanetas, por não terem sua órbita desobstruída. Ainda como representação da gravidade, há o nítido movimento espiralado da toalha sobre a mesa, que imita o movimento dos planetas. Já as bordas da toalha elevam-se em direção à proestrela, representando que a gravidade continua sempre a atuar, mesmo a longas distâncias, por uma força, descrita por Newton, que se reduz com o quadrado da distância entre os corpos.

Representação artística da formação de um sistema solar
Naturaleza Muerta Resucitando foi o último quadro de Remédios Varo, que morreu em 1963. Compreender o significado do nome deste quadro implica saber que uma estrela, na verdade, nunca morre. Após completar seu ciclo de fusão e acabar o material combustível, ela se dispersa pelo universo e, eventualmente, participará de nova nuvem molecular, que irá se condensar, por manutenção do momento angular irá girar e achatar-se, e formará novas estrelas e planetas.  Assim, a natureza “morta” se reinventa, se recicla, ressuscita. (nosso próprio Sol é uma estrala de segunda geração)
(Existe outra análise desse quadro muito diferente desta, na qual a mesa representa a infância de Remédios Varo, a vela a pureza espiritual buscada pela artista, e as “frutas explodindo” os obstáculos vencidos. É interessante para ver o quanto essas obras podem ser subjetivas.
Está disponível em: http://clio.rediris.es/exilio/remediosvaro/ObrascomentadasRVaro.htm)